Monday, November 17, 2014

IMPOTENTES E ENGASGADOS

Em Portugal, ao confronto com as evidências respondem frequentemente os responsáveis que não sabem, não se lembram, ou não têm poderes para evitar as consequências de acidentes observados nas suas áreas de respnsabilidade ou intervenção.

Em Agosto de 2010,  o Procurador Geral da República Pinto Monteiro afirmou ao DN, "Tenho os poderes da Raínha de Inglaterra", desculpabilizando-se, deste modo, das ineficiências do Ministério Público publicamente expostas. Num país onde o sentido de serviço público emanasse do topo da hierarquia para a base, o sr. Pinto Monteiro deveria ter-se demitido por impossibilidade de exercício das suas funções se, como seria esperável, tivesse tentado, sem êxito, remediar a impossibilidade de que se queixava. Não o fez, e continuou a receber os honorários e a usufruir as deferências inerentes ao cargo, mandendo-se, consequentemente, as ineficiências do orgão do Estado de que era o primeiro responsável. Por quê? Uma pergunta que o jornalista do DN não fez.

Hoje, durante a audição na Comissão Parlamentar de Inquérito ao caso BES, o sr. Carlos Costa, governador do Banco de Portugal declarou: "Se pudesse, tirava a idoneidade a Ricardo Salgado. Mas não tinha poderes" "O poder do BdP está aquém do que eu gostaria. O dever só é exequível se for acompanhado de poder" - aqui.* Por que se manteve então em funções desde o momento em que reconheceu essa insuficiência de poderes, e de que o seu antecessor também se queixou durante a audição em CPI ao caso BPN? Uma pergunta que os deputados, hoje, também não fizeram.


Ouço as respostas do vice-governador Pedro Duarte Neves, responsável (entretanto afastado) pela supervisão do Banco de Portugal, enquanto teclo estas linhas, e é confrangedor ouvi-lo. Inseguro, impreparado, enleado numa teia de declarações contraditórias, é espantoso saber-se agora que foi este o homem incumbido da supervisão do sistema bancário português em tempos de crise e do, então, maior escândalo financeiro observado em Portugal. Tudo o que ele diga, mesmo que diga a verdade, é embrulhado de modo aparentemente suspeito.

Desligo. Vou jantar.  

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* Cecília Meireles, deputada do CDS, lembrou que o artº. 141 do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras passou, desde há dois anos, a atribuir poderes bastante amplos e de interpretação muito aberta.
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Comentário colocado hoje (18/11) aqui:

"Concordo que é altamente improvável que desta CPI resulte um relatório subscrito, pelo menos, pelos partidos que têm governado o pais. Também penso que as CPI servem sobretudo para exibição televisiva dos intervenientes no inquérito. Já tenho dúvidas se, numa implícita defesa dos Espírito Santo, não se venham a juntar os argumentos do PS aos do PSD e CDS, uma vez que Ricardo Salgado nunca discriminou nenhum deles, e há muita gente de qualquer dos lados refém dessas ligações antigas. Por outro lado, parece-me menos pertinente, e não me movo nem nunca me movi por influências partidárias, de que seja relevante anatematizar ou condenar o sistema financeiro uma vez que o sistema financeiro se desprestigiou de forma inultrapassavelmente exuberante.

Quanto ao Banco de Portugal, o menos que se pode dizer é que o governador imitou o argumento do PGR Pinto Monteiro quando há quatro anos atrás se condiderou tão impotente como a Raínha de Inglaterra. Se era assim, por que razão se manteve no cargo? O mais inábil, mas consciente e honesto, dos condutores de camião recusa-se a seguir viagem se reconhece que os travões da viatura estão a precisar de calços. Quanto ao vice-governador Pedro Neves, pasmei, ao ouvi-lo durante algum tempo, impreparado, inseguro, engasgado. E percebi porque é que a supervisão também falhou. Falhou porque a chefia da supervisão esteve entregue durante oito anos a uma personalidade, porventura tecnicamente altamente competente, mas pusilânime."

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