Tuesday, March 12, 2013

ACERCA DA INSUSTENTABILIDADE DO SISTEMA DE REFORMAS E PENSÕES

A invocada insustentabilidade do sistema de pensões e reformas tem levado o Governo a adoptar medidas que, mesmo sem sabermos ainda se o Tribunal Constitucional as vai, em parte ou na totalidade, chumbar ou não, continuará a persistir se para cortar as despesas do Estado o executivo continuar a optar por medidas que podem remediar a curto prazo mas não solucionam sustentadamente o problema. Ainda não há tanto tempo assim, o então ministro da pasta, Vieira da Silva, garantia a sustentabilidade do sistema com as alterações que lhe introduziu e a União Europeia aplaudiu, guindando Portugal a um lugar pioneiro na matéria. Viu-se.   
 
Há, para além da falta de recursos suficientes,  uma falta de informação gritante da parte da administração pública também nesta área crítica. Serão muito poucos os que têm conhecimento de, por exemplo, 1) - que parte do montante total das reformas é atribuida a beneficiários não contributivos; 2 - a quanto montam as reformas pagas aos contributivos da segurança social e qual o montante das contribuições pagas pelos trabalhadores e entidades patronais privados; 3 - qual o montante das pensões pagas a funcionários públicos; 4 - qual o montante de pensões de regimes especiais;
 
Há outros aspectos relevantes nesta questão das pensões e reformas mas os enunciados chegam para reflectir, de forma abreviada, porque um caderno de apontamentos não é um tratado, sobre os entorses de um sistema que tem de ser revisto de alto a baixo se o objectivo é continuar a sua gestão sob a alçada do Estado.
 
Desde logo, é fundamental separar o  que deve ser suportado por impostos (reformas dos não contributivos), do que é suportado pelas contribuições dos activos e respectivas entidades patronais (reformas de contributivos), do que deve ser suportado por impostos (pensões da função pública em geral), do que deve também ser suportado por impostos (regimes especiais da função pública).
 
Depois há que distorcer (díficil, concordo) aquilo que foi torcido durante muitos anos e que, realmente, contribui para a insustentabilidade actual do sistema: todas as pensões e reformas deveriam ser recalculadas segundo o mesmo método e tomando como dados de base para os cálculos as contribuições feitas durante toda a carreira contributiva, fixando-se o valor das reformas anuais em função das contribuições dos privados no ano anterior, e as pensões da função pública na mesma medida. No caso de insuficiência das contribuições de um ano para assegurar o pagamento das reformas, as reformas e pensões deverão ser reajustadas no ano seguinte. 
 
Dito de outro modo, o valor das pensões e reformas deve ser ajustado à evolução do crescimento (ou decréscimo) do rendimento nacional e as contribuições para o regime geral da Segurança Social são o melhor indicador dessa evolução para este efeito. Por outro lado, deve ser a sociedade como um todo que deve suportar, através dos impostos que paga, a solidariedade social no pagamento de pensões atribuidas aos não contributivos. O sistema teria deste modo um estabilizador automático, eliminando também o conflito inter geracional.
 
Há já muito tempo anotei algumas vezes  neste caderno que a evolução das remunerações da função pública e dos trabalhadores dos serviços públicos prestados pelo Estado deveria ser determinada pela evolução do rendimento nacional. Há umas semanas atrás li que Rui Rio defende a indexação do valor das reformas e pensões à evolução do PIB. Não faço a mínima ideia como é que Rui Rio, que apenas enunciou uma proposta, pensa em que moldes ela se poderia vasar. A mim, ocorreram-me os que referi.
 
Ainda a propósito de pensões, reformas e fundos de pensões: a taxação em sede de segurança social (para além da tributação) dos fundos privados determinada pelo Governo vai infalivelmente provocar a sua extinção. Quem é que, obrigado a descontar toda a vida para a segurança social, vai continuar a voluntariamente constituir um fundo privado se, também ele, for sujeito a uma tributação iníqua?

3 comments:

Manuel Rosa. said...

Parabéns pela qualidade deste seu post.

Junto alguns números, aproximados, que espero dêem um contributo para responder a algumas das questões por si levantadas.

Todos os dados são tirados da "Conta da Segurança Social de 2011" e do "Relatório e Contas da Caixa Geral de Aposentações de 2011". Os valores referidos são em mM€ - mil milhões de €.

Vejamos a situação por subsistemas:

1) Segurança Social - Regime Contributivo:

Pensões recebidas - 10 mM€.
Prestações Sociais recebidas (exº:subsídio de desemprego, subsídio de doença,prestações familiares) - 4 mM€.
Contribuições pagas por empregados e empregadores - 14 mM€.
Verbas recebidas do Orçamento de Estado - 0 mM€.



2)Segurança Social - Regime Não Contributivo:

Pensões e Complementos de Pensão - 4 mM€.
Prestações Sociais (exºAção Social, R.S.I., C.S.I., prestações familiares) - 4 mM€.
Contribuições pagas - 0 mM€.
Verbas do Orçamento de Estado - 8 mM€.


3) Caixa Geral de Aposentações

Pensões recebidas - 8 mM€.
Contribuições pagas por funcionários e entidades empregadoras - 4 mM€.
Verbas do Orçamento de Estado - 4 mM€.


4) Resumo:

Pensões recebidas 10+4+8 =22 mM€.
Prestações Sociais 4+4 = 8 mM€.
Contribuições 14+4 = 18 mM€.
Verbas do Orçamento de Estado 8+4 = 12 mM€.
Pensões + Prestações Sociais = 30 mM€.

5)As Prestações Sociais acima referidas são as chamadas "Prestações Sociais em Dinheiro" que valem, como vimos, cerca de 30 mM€. Não incluem as chamadas "Prestações Sociais em Espécie", basicamente Despesas de Saúde, pagas pelo Orçamento de Estado, e que valem cerca de 8 mM€.

Os números acima são aproximados mas, na minha opinião, válidos para dar uma razoável "big picture" da situação.

Os números apresentados permitem ainda refutar a ideia instalada de que tudo na Segurança Social é Despesa do Estado, esquecendo o peso significativo das Contribuições de trabalhadores e empregadores.

rui fonseca said...

Caro Manuel Rosa,

Muitíssimo obrigado pelo seu contributo.

Jorge Ramiro said...

É uma boa contribuição, acho que sim. Eu não sou bom em matemática, por isso preciso sempre ajuda com essas coisas. Eu sou um comerciante e vendo roupas para cachorro. Então, uma vez mais, obrigado pela contribuição.