Wednesday, February 08, 2012

O ERRO DE PASSOS COELHO

Em tempos de austeridade a sensibilidade anda mais à flor da pele. Passos Coelho deveria saber isso tanto mais que ainda não se calaram as críticas generalizadas feitas a Cavaco Silva a propósito das declarações sobre as suas pensões e despesas. Pedir aos portugueses que sejam menos piegas é uma a afirmação desastrada nos tempos que correm por mais voltas que se lhes dê. Trata-se de uma afirmação que, facilmente retirada do contexto, se sobrepõe a tudo o resto e destrói o melhor estruturado dos discursos. Mas este está longe de ser o maior erro de Passos Coelho.
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Passos Coelho não dispõe, e esse é o seu erro primordial, de uma maioria de apoio bastante para suportar a execução de uma política que durante os próximos anos será incontornavelmente impopular. Desde há muito que venho insistindo que o governo de gestão das imposições da troica deveria integrar todos os seus aderentes e, muito naturalmente, o partido do governo que o subscreveu em nome da República: o PS.
Passos Coelho não entendeu assim, prosseguindo aliás a posição de autosuficiência do seu antecessor, e os resultados começam a estar à vista.

As fracturas começam a desenhar-se cada vez com mais nitidez por mais que se desvalorizem as aparências.
Mesmo dentro do seu próprio partido, Passos Coelho começa a enfrentar uma contestação cada vez mais evidente, mesmo nos indícios aparentemente menos relevantes.

A propósito da não tolerência de ponto no Carnaval, uma decisão que me parece muito pertinente, é crescente o número de Câmaras que estão a decidir-se pela continuidade desse bónus de férias ao pessoal.
Para além daquelas onde o Carnaval é cartaz turístico local (Torres Vedras, Loulé, Ovar, e não sei se mais alguma) decidiram-se pela tolerância de ponto outros municípios onde o Carnaval nem sequer é arremedo importado do Carnaval brasileiro. Lisboa e Porto são os mais significativos.

Rui Rio tem até agora apoiado, com uma ou outra reserva tornada pública, o governo actual. Já António Costa é, obviamente, opositor do actual governo. Se, também neste caso, é entendível sem dificuldade a oposição de Costa já é menos perceptível a oposição de Rui Rio, que, inesperadamente, se revelou um português piegas.

Dentro do próprio governo, Paulo Portas, que não costuma desalinhar-se das posições dos governos de que faz parte, reagiu à polémica declaração do primeiro ministro, dizendo que os portugueses devem ser bem tratados porque estão a enfrentar o desafio da crise. 

Passos tinha afirmado, a propósito das declarações de Cavaco Silva quanto a pensões e despesas suas, que o Presidente da República estava sujeito às vicissitudes da crise como qualquer outro cidadão. Por outras palavras: deixa-te de pieguices, Aníbal!

Deixa-te de autosuficiência, Pedro: A crise desmorona-te a base de apoio, mais tarde ou mais cedo. Se não a alargas mas a estreitas com desabafos impopulares, cais mais cedo que o previsto.

4 comments:

aix said...

Sendo, como tu constatas e eu confirmo, um profundo ignorador dessas ciências tão convictas que são as economias,agradecia-te que tu ou os teus amigos do 4R me dessem 3 razões, substantivas e comprováveis,para eliminar os célebres 4 feriados (+ o entrudo).
Se me convencerem passarei a ser um forte adefensor da eliminação de todos eles. Abç

rui fonseca said...

Caro Francisco,

Mas se sou "um profundo ignorador dessas ciências tão convictas que são as economias" como é que posso dar-te uma resposta aceitável?

Quanto aos amigos que referes (e não sei a quantos te referes, mas não exageres) não posso responder por eles, como é óbvio.

Quanto ao que me toca, e sem recorrer à análise económica, recorro à aritmética: A produção é função de muitas coisas mas também das horas trabalhadas. Quanto menos horas trabalhas menos produzes e vice-versa, sobretudo nos casos de sectores de
mão-obra-intensiva, que ainda representam uma parte substancial da nossa economia.

Mas não só.
Vejamos os casos que se acumulam nos tribunais. Podemos reduzir o seu número através de várias medidas mas, inquestionavelmente, supondo tudo o resto constante (com mais ou menos tecnologia, com outras leis etc.) o trabalho realizado é função também do tempo que se lhe dedica.

Vejamos o caso dos médicos: Quanto mais tempo trabalharem mais doentes podem atender.

Tudo isto, evidentemente, até à observação negativa da lei dos rendimentos decrescentes.

É pano que dá para muitas mangas. Mas, caro Francisco, se a produção não dependesse do tempo de trabalho por que razão se trabalha?

Por que é que os chineses são mais competitivos? Por vários motivos entre os quais porque trabalham mais horas.
Vamos então encaminhar-nos para uma política laboral à chinesa?
Não devemos ir, mas para não ir há
situações que têm de ser mudadas.

Mas esse é outro aspecto (muito relevante) do problema.

aix said...

Caro Rui,
Obviamente que a ignorância em matérias de economias se referia a mim e não a ti.Por isso é que eu nunca seria capaz de atingir a equação: + horas de trabalho= a + produção.Mas pronto, vocês lá sabem e eu,então, tenho razão:
eliminem-se todos os feriados, incluindo o da 'tolerância' (que é o que não nos deve faltar nestes tempos obscuros).
Declaração de interesse: como, na reforma, dei em pastor, cada feriado gozado daria em dia de fome para o meu gado.
Grande abç

rui fonseca said...

"eliminem-se todos os feriados, incluindo o da 'tolerância' (que é o que não nos deve faltar nestes tempos obscuros)."

Sofisma, caro Filósofo.
Não é?