Sunday, September 11, 2011

CCB, OUTRA VEZ

Senhor Presidente do
Centro Cultural de Belém

Em 22 de Abril de 2009 enviei-lhe a mensagem que transcrevo a seguir.
Mais de dois anos depois, continua tudo na mesma, conforme constatei ontem durante o Concerto Inaugural do CCB.
Eu sei que o concerto era gratuito para os "Amigos do CCB" (uma iniciativa louvável) mas recuso-me a acreditar que dezenas de "Amigos" tenham levantado os bilhetes a que tinham direito e tenham faltado ao espectáculo por razões de última hora.

Lamentavelmente, a prática corrente de entradas gratuitas a "convidados", conhecida na gíria como "borlas", em espectáculos realizados em instalações pagas pelo erário público, não é apanágio do CCB mas uma vergonha geral.

Ontem, fui obrigado a comprar bilhetes de camarote lateral porque na plateia os lugares estavam esgotados, segundo informação da bilheteira. Não estavam. De lá de cima, daqueles lugares incómodos, em consequência de uma solução arquitectónica do tempo dos afonsinos, que nos obriga a um torcicolo para ver três quartos do palco, observei que havia dezenas de lugares vazios na plateia, antes do intervalo. A seguir ao intervalo,  a plateia compôs-se com os que desceram de lá de cima das galerias.

Termino com a minha apreciação deste Concerto Inaugural. Gostei bastante. Porque, para além da grande qualidade do concerto, paguei bilhete.

Com os meus cumprimentos,
Rui Fonseca
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22 de Abril de 2009
Senhor Presidente
do Centro Cultural de Belém,

Cerca de três semanas antes do concerto no CCB, "Música Para Quatro Mãos", de Maria João Pires e Ricardo Castro, no dia 9 deste mês, a bilheteira informava que a plateia se encontrava já esgotada e sobravam apenas alguns lugares em camarotes.

No próprio dia 9, umas horas antes do início do concerto, dois amigos nossos conseguiram comprar dois bilhetes de plateia, "os únicos que havia disponíveis em resultado de duas desistências de última hora", segundo informação da bilheteira.

Quem conseguiu assistir ao concerto pôde constatar que na plateia ficaram vazias cerca de 50 cadeiras.

Estou certo de que isto não constitui para si uma novidade. Muito menos que uma não novidade, aliás, é uma banalidade. Não só no Centro Cultural de Belém, mas também em outras salas subsidiadas com dinheiros públicos.

Não foi, evidentemente, o caso que em concreto refiro que me levou a escrever-lhe mas a banalidade e a indiferença com que estas situações acontecem.

.Eu sei, senhor presidente, que há uma tradição neste Portugal de mamadores do Estado que vem de longe e é, porventura, difícil expurgar.Eu sei que há patrocinadores que trocam apoios por entradas (um negócio que lhes dá fama de beneméritos e proveitos de entradas gratuitas) que distribuem a amigos e conhecidos nem sempre interessados na oferta. Eu sei que de si esperam os manobradores do aparelho do Estado os tradicionais envelopes com os convites mesmo que as agendas não lhes consintam ou o desinteresse os desmotivem a usá-los.

Todos suspeitamos que, lamentavelmente, ninguém abdicará deste consuetudinário de miseráveis mordomias sem rancor e sem vinganças.

Por tudo o que o senhor presidente bem sabe e nós presumimos, não lhe sugiro que acabe de vez com a babugem. Peço-lhe apenas que lhes solicite com cortezia qb que, no caso de estarem interessados nas borlas prometidas, levantem, ou mandem levantar, os seus bilhetes até dois dias antes dos espectáculos. Vai ver que lhe sobrarão muitos bilhetes que pode vender a preços reduzidos a jovens que não têm trocos suficientes ou nunca tiveram a oportunidade de escutar ao vivo Maria João Pires, por exemplo. Deste modo semeará para daqui a cinco ou dez anos colher uma assistência mais interessada e disposta a pagar bilhete inteiro.

Já agora, permita que faça perder tempo a quem ler esta missiva com mais dois pontos:

1 - Não me sinto marginalizado ou ressabiado por não me tocarem convites. Antes, pelo contrário: o que me indigna é não poder comprar bilhetes porque as lotações estão esgotadas e só recorrendo a borlas consigo entradas.

2 - Diz-se, frequentemente, que a corrupção campeia em Portugal e as cunhas matam as competências. As borlas são o exemplo mais acabado da mesquinhez das cunhas com que se prestigiam muitas das nossas elites.

Está nas suas mãos, senhor presidente, contribuir para que a sociedade que vai ao CCB seja globalmente mais decente.

Com os meus cumprimentos,

Rui Fonseca

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