Sunday, January 18, 2009

SONHOS E RABANADAS - 6

Pois é verdade, embora pareça mentira: recebemos convite para a Inauguration!

Toda a gente a perguntar-nos se íamos à Inauguration e a gente a encolher-se reconhecendo que não tínhamos convite. Uma frustração em perspectiva.

Até descobrirmos que o cunhado tem um primo que é irmão de um fulano casado com uma funcionária do consulado de Portugal em Washington, e fomos convidados! A cunha é uma instituição notável, digam os frustrados crónicos o que quiserem, o cunhado conhece meio mundo, cunhas é com ele. Sem cunha ficaríamos em casa a ver a Inauguration pela televisão como qualquer fulano no fim do mundo. Com cunha somos parte do corpo diplomático confortavelmente sentado a menos de trinta metros da tribuna, e ninguém perde com isso. Só lucro.
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E lá fomos. De carro até à estação de Great Falls Church e de metro até L´Enfant Plaza metro station. Mas não foi fácil: em Falls Church o parque estava apinhado, andámos por ali às voltas a ver se alguém saía, estávamos quase a desistir quando um casal ainda jovem atravessou à nossa frente a rodopiar as chaves nos dedos e entrou no carro do outro lado. Demos a volta tão céleres quanto a imprudência permitia, o lugar lá estava, ainda quente. Foi só entrar e correr para a estação para apanhar o próximo comboio, dali a três minutos. Iria a deitar por fora, como um combóio indiano em dia de festa, se as portas não recusassem a entrada aos que chegaram depois.
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Lá dentro ia uma chinfrineira de se tirar o chapéu senão abafava-se. Quando, finalmente, chegámos a Washington e o pessoal começou a sair, é que percebemos que até chegar aos lugares reservados ao corpo diplomático, isto é, à nossa gente, tínhamos de atravessar toda aquela distância, meia milha talvez, entre pessoal sentado ou estendido ao sol, sem darem pelo frio que que fazia, à espera que a Great Parade começasse para eles e a Inauguration para nós.
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É durante este deambular entre a multidão que quase tropeçamos com um cavalheiro, ofegante, em fato de treino, a saltitar e a olhar à roda, aparentemente perdido, com aspecto de quem a quem o jogging só pode fazer mal ao coração e à coluna. Reconheci o tipo mas não conseguia ver donde.
E disse: Bom dia! para o ar.
O tipo olhou-nos como quem olha uma bóia caída por obra e graça do céu, e respondeu: Bom dia!
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Era, nem mais menos, que o nosso poliédrico ministro das finanças.
Tinha saído do hotel com o pelotão da representação portuguesa, encabeçado pelo primeiro-ministro, mas perdera o contacto com os da frente, no meio daquela americanada toda, depois de ajustar as meias que tinham escorregado por serem grandes demais os ténis que lhe tinham emprestado.
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E ali estava ele sem saber o caminho de volta e sem dinheiro para um táxi que o levasse a tempo de se apresentar para a Inauguration. Emprestámos-lhe vinte dólares, e ele garantiu-nos que as hipóteses de reembolso eram elevadas, ia estar com os tipos do FMI, não seria ainda desta que o estado iria cessar pagamentos.
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A Inauguration foi um must, charme a extravasar urbi et orbi.
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Voltar foi outra aventura enlatada mas mais sossegada. Aparte um ou outro mais bebido, percebia-se que vinham da festa.
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Ao chegar a Great Falls Church é que foi o bom e o bonito: não encontrámos o carro. Demos voltas e mais voltas a perceber se não teríamos trocado as coordenadas mas concluímos que o carro tinha sido rebocado por estacionamento reservado a grávidas. Pensámos chamar táxi mas os únicos vinte dólares em caixa tinham sido emprestados ao ministro.
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E, agora?, como voltamos para casa?
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Está decidido: Não vamos à Inauguration. Veremos a Great Parade et Orbi.

3 comments:

António said...

Bom dia.
Uma coisa que aprecio é o seu optimismo, que verifico ser cada dia menor.
Benvindo!

Mas não desanime, porque se aproxima uma das grandes medidas para acabar com a crise.
Sócrates vai legalizar o casamento da p.......ragem e todos os sábados poderá assistir a festas muito cor do arco-iris.
Aquilo a que você queria assistir, na América, com o tempo encoberto, alguma neve era um bocado a preto e branco.
Aqui vai ser melhor. Mais colorido, mais cor-de-rosinha.E sempre poderá trocar o Armani pela Augustus.

A Chata said...

Fico estarrecida.
Como é que alguém, num Mundo destes de despedimentos aos milhares, empresas a falir todos os dias, guerras sangrentas, fome, miséria se preocupa em afirmar com convicção a sua opção sexual e criticar a de outros.
Se é para desviar atenções, a maneira como é feito, é, no minimo, de mau gosto.

Porque é que pessoas, que pagam impostos, cumprem os seus deveres civicos, contribuem com o seu trabalho para o país devem ser tratadas com escarnio e ver os seus direitos diminuidos apenas porque não concordamos com o genero da pessoa com quem decidem partilhar a vida?

Em que é que o facto de os homosexuais se casarem legalmente afecta a liberdade ou os direitos dos outros membros da sociedade?

Triste, muito triste...

António said...

???