Wednesday, October 17, 2007

A GUERRILHA DO PETRÓLEO

Não voltámos aos tempos da guerra fria, os tempos de hoje são de guerrilha do petróleo, esperando-se que as múltiplas frentes onde a guerrilha se trava não degenere numa guerra global que acabaria, eventualmente, com todas as discussões até nova iniciação biológica.
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A visita de Putin ao Irão, o segundo maior produtor de petróleo da OPEP, sessenta anos depois da última visita de um presidente russo (Estaline) aquele país, na mesma altura em que o parlamento turco se prepara para dar carta branca às suas tropas para atacarem, quando julgarem oportuno, os curdos em território do Iraque, onde reside o potencial petrolífero do futuro, não pode ser interpretada como casual.
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Putin assinou em Teerão um acordo, que juntou as nações que circundam o mar Cáspio, que proíbe qualquer um destes países de permitir que forças estrangeiras usem o seu território para atacar uma das cinco nações que assinaram o acordo, quaisquer que sejam as circunstâncias.
Na circunstância, Putin defendeu ainda o programa nuclear iraniano, demonstrando o seu não alinhamento, também neste caso, com os europeus (e, por maioria de razões, com os norte-americanos) e não ter cedido aos argumentos da chanceler alemã com quem se encontrou antes de partir para Teerão.
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Todo este ambiente de provocação de confrontos naquela área do Globo relembra-nos a situação vivida na mesma região em finais de 1979. A 4 de Novembro, a meio da manhã, a embaixada dos EUA foi invadida por um grupo de jovens, que se diziam estudantes, e fez prisioneiros cinquenta pessoas que trabalhavam na embaixada. Foi o início do segundo choque petrolífero. Carter, o presidente norte-americano na altura, tinha, por razões políticas, recusado a entrada ao Xá nos EUA para tratamento médico (soube-se mais tarde que sofria de cancro) mas acabou por ceder às pressões internas e o Xá deu entrada num hospital de Nova Iorque em 23 de Outubro. E este foi o pretexto invocado pela ocupação da embaixada, que iria durar 444 dias.
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"The hostage crisis transmitted a powerful message: that the shift of the power in the world market in the 1970´s was only part of a larger drama that was taking place in global politics"
Daniel Yergin - The Prize
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Em fins de Novembro de 79, poucas semanas depois da ocupação da embaixada, cerca de 700 fundamentalistas ocuparam a Grande Mesquita de Meca, em protesto contra as ligações dos governantes sauditas aos norte-americanos. Acabaram, dificilmente, por ser desalojados antes que o movimento desencadeasse uma escalada imparável, mas a acção provocou ondas de choque em todo o mundo Islâmico. No princípio de Dezembro, houve um protesto Shia em al-Hasa, no centro da região petrolífera saudita.
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Quase no fim desse ano, a Rússia invadiu o Afeganistão, vizinho do Irão e dos estados do Golfo. Era a primeira intervenção em larga escala das forças armadas Soviéticas fora do bloco comunista após o fim da Segunda Grande Guerra. A esta acção militar dos soviéticos respondeu Carter anunciando o que ficou conhecido como Doutrina Carter: "Let our position be absolutely clear. An attempt by an outside force to gain control of the Persian Golf region will be regarded as an assault on the vital interests of the United States of America, and such an assault will be repelled by any means necessary, including military force" . Para não enfrentar, directamente, os soviéticos, os EUA ajudaram os rebeldes afegãos numa guerra desgastante que viria a mostrar-se fatal para o regime de Moscovo.
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A Doutrina Carter, relembra ainda Daniel Yergin em "The Prize", tornou mais explícita a posição de todos os presidentes norte-americanos desde Harry Truman, que não foram senão, (e continuam a ser), ressonâncias da Declaração de Landowne de 1903, quando o governo inglês (o dominador de então) advertiu a Rússia e a Alemanha que deveriam não intrometer-se, a qualquer título, no Golfo Pérsico.
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Só há, inquestionavelmente, um modo de acabar com a guerra nos cantos do mundo onde mora o petróleo: inventar um sucedâneo que não tenha morada certa. A actual dependência do petróleo não é apenas a principal causa de impossibilidade de paz, é também a maior ameaça à continuidade da humanidade.

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